A chamada questão moral, ou seja, o problema da desonestidade política, apresenta uma seqüência conhecida dos especialistas, como dos simples observadores políticos: ela vem a tona por ocasião de algum escândalo momentaneamente original — e portanto de repercussão mais dramática nos meios de comunicação —, mas este sempre é recuperado logo adiante ou acaba “normalizado” pela inexistência prática (ou fabricada) de responsáveis diretamente incrimináveis, para cair finalmente no esquecimento de uma imprensa eternamente à cata de “escândalos frescos”. Aqueles que ameaçam com “cadeia” estão justamente caindo na “normalidade” do vocabulário político, oferecendo em frases ocas remédios que sabem ser inexeqüíveis, pelo menos neste Brasil tão complacente com políticos de honestidade duvidosa. Mais uma vez, caberia a pergunta: houve alguma mudança dramática a partir da substituição do que se considerava direita pela esquerda na condução geral dos negócios do Estado?
O problema, podemos dizer, não é apenas brasileiro, pois a classe política de respeitáveis países considerados “desenvolvidos” também já esteve envolvida em negócios e operações de moralidade algo dúbia, quando não claramente ilegais. A diferença, retorquirá o pessimista tupiniquim, é que aqui as saúvas não são incomodadas por nenhum tipo de judiciário ou procurador público, como em terras de puritanos auto-penitentes. De acordo, concede o racionalista, mas vejamos, por exemplo, os casos da Itália e do Japão: há exemplos de democracias avançadas que tenham grande parte de seus políticos em tamanho descrédito como esses dois países, situados nas antípodas da cultura política contemporânea? Os Estados Unidos não têm, por sua vez, uma classe política mais virtuosa do que suas congêneres dos países citados, mas ostenta, provavelmente, uma das imprensas mais combativas do planeta, além de uma justiça pouco complacente com os “desviantes”.
Em todos esses países a chamada “questão moral” costuma freqüentar o universo do jornalismo político e chega mesmo a ingressar nas salas dos tribunais. O problema da desonestidade política é praticamente universal, ainda que ele encontre arranjos nacionais absolutamente específicos do ponto de vista da ética pública. O tratamento dessa questão, digamos desde já, não pode ser equacionado com a introdução de simples reformas institucionais, mas parece exigir uma espécie de redirecionamento cultural e ético da classe política, algo como uma “reforma moral” que diminua o abismo aberto na base da sociedade política entre a “ética dos resultados” e a “ética dos valores”. Cabe o registro, em todo caso, de que a tradicional divisão entre esquerda e direita não parece ter nenhuma influência na distribuição entre grupos e indivíduos “éticos” ou “desviantes”.
Fonte: Google
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