terça-feira, 30 de agosto de 2011

O HOMEM NA FILOSOFIA DE MARTIN HEIDEGGER


O pensamento filosófico de Martin Heidegger, em sua visão antropológica, desvela a essência do homem e seu significado existencial. Vemos em Heidegger que a essência do homem depende de sua relação com o ser, não de algum tipo de racionalidade. O homem é dotado de racionalidade, porém não é isso que define a sua essência. Na visão heideggeriana, a essência do homem reside na sua ek-sistência e a ek-sistência é a clareira do ser. Portanto, a essência do homem é relação com o ser.
Tradicionalmente, o homem é visto como envolvendo três constituintes: o corpo (Leib), a alma (Seele, o princípio animar, responsável por estarmos vivos e por nossa vida mais baixa, apetitiva e emocional), e espírito (Geist, nossa razão "capacidade de dizer eu"). Heidegger desconsidera essa compreensão tradicional do homem, pois a Antropologia, o estudo do homem, anthropos, tenta então reunificar o homem. O seu erro, no entanto, foi tratá-lo como um ente dotado de uma natureza intrínseca bem própria, destituído de sua especial relação com o ser.
A Filosofia heideggeriana fez uma crítica radical à metafísica clássica (desde Aristóteles até Hegel), dizendo que Parmênides descobriu o ser. Já Platão, o teria ocultado por buscar o sentido do ser nos entes. Todos os filósofos anteriores a Heidegger não teriam compreendido o ser, por identificá-lo com a objetividade.
Heidegger, em sua Filosofia, interessa- se pelo aspecto ontológico. Ele busca o sentido do ser ("Por que existe o ser e não o nada?"), perguntando-se pelo ente que o corporificaria exemplarmente. E o encontra no homem, por ser o único ente que tem consciência do ser (o homem é o "pastor do ser", que guarda e escuta o ser).
De todos os entes, o homem é o único ao qual é funcionalmente exigida uma solução para o problema do existir, segundo Heidegger
Portanto, o homem é o ser-aí (Dasein): o único que existe é o ser individual e finito que está aí e seu modo de ser (essência) é a existência, ou seja, o conjunto de possibilidades de vir a ser. As coisas são, mas não existem, isto é, só o homem existe. A existência, contudo, é o poder ser, ou seja, o ato de projetar-se, utilizando as coisas como instrumentos e elas não são para a contemplação, mas para serem usadas pelo homem, isto é, o ser das coisas é sua utilidade para o homem. O homem compreende as coisas quando descobre para que servem (como utilizá-las) e compreende a si próprio quando descobre o que pode ser.
Heidegger utiliza o termo Dasein, isto é, "Ser-aí, presente, disponível, existir". Para ele, o Dasein unifica o homem, evitando a tradicional tripartição em corpo, alma e espírito. Ele não localiza a essência do homem em alguma faculdade específica, tal como a razão. Um dos aspectos centrais de Dasein, junto com o ser-lançado e a decadência, é a existência, e isto significa que ele tem de decidir como ser. Dasein não é essencialmente e inevitavelmente racional. Obra de Zuber Buhler Fritz, O espírito da manhã
O Dasein ou a existência significam que nós não apenas somos, mas percebemos que somos, mas nunca estamos acabados, como algo presente. Não podemos rodear a nós mesmos, mas em todos os pontos, estamos abertos para um futuro e temos de conduzir a nossa vida. Estamos entregues a nós mesmos e somos aquilo que nos tornamos.
A questão fundamental da Filosofia não é o homem, mas sim o ser, não só do homem como de todas as coisas. Uma Filosofia que colocasse o homem como centro de preocupação seria antes uma Antropologia. Heidegger afirma que, a questão que lhe preocupa não é a existência do homem e sim a questão do ser em seu conjunto e enquanto tal. Assim, o principal objetivo da obra Ser e Tempo é investigar o sentido do ser. Para efetuar tal tarefa, começou investigando o ser que nós próprios somos. Podemos perceber que a pergunta principal de Heidegger é: qual é o sentido do ser? Ele substitui a pergunta dos filósofos clássicos - o que é o ser? Pois, para ele, essa ficou indevida por estar clara e evidente.
O ponto de partida necessário de toda tentativa por determinar, em seu rigor, o ser do ente em geral, era o homem como ser-aí ou Dasein. Pois, de todos os entes, o homem é o único ao qual é funcionalmente exigida uma solução para o problema do existir. Assim, criando uma terminologia própria, Heidegger denomina o modo de ser do homem, nossa existência, com a palavra Dasein, cujo sentido é ser-aí, estar aí.
É fundamental reafirmar, contudo, que o filosofar heideggeriano é uma constante interrogação, na procura de revelar e levar à luz da compreensão o próprio objeto que decide sobre a estrutura dessa interrogação, e que orienta as cadências do seu movimento: a questão sobre o Ser. Assim, em linhas gerais, buscará a compreensão do homem em Heidegger enquanto Ser-aí, revelado por meio da relação com o Ser.
Heidegger fez adaptações da Fenomenologia, necessárias para a análise das temáticas existenciais. Ele não aceitava a denominação de existencialista, mas de filósofo da existência, isto é, Heidegger elaborou uma Filosofia da existência. Ele percebeu, no método fenomenológico, a possibilidade de uma descrição dos mais variados aspectos da existência em sua total nudez, livre dos entraves das tradições filosóficas e religiosas ou dos constructos cientíticos.
Por meio da Fenomenologia, Heidegger foi conduzido a refletir a respeito da questão fundamental, isto é, a problemática do Ser. A Fenomenologia de Husserl foi absoluta para o desenvolvimento do pensamento de Heidegger, pensamento esse que se caracteriza pela análise metódica, pela clareza na exposição e o rigor científico, que ensinava a tomar consciência num período de dissolução interna e externa de tudo o que era estável, obrigando a evitar toda a linguagem grandiloqüente, a provar cada conceito na intuição dos fenômenos, pois a Fenomenologia é precisamente a arte de desvelar aquilo que, no comportamento quotidiano, ocultamos de nós mesmos1.
Uma das grandes mudanças que Heidegger fará à Fenomenologia será a sua dissociação do idealismo das idéias, caracterizadas pelas intenções transcendentais, para partir da vida real. A função da Fenomenologia consiste em inserir-se nessa realidade, que foge à total autotransparência, e nela manifestar aquilo que ali se oculta da reflexão, assim como a partir de si manifesta- se, isto é, ocultando-se para a radicalidade reflexiva. É só assim que podemos atingir o ser do ente, muito além das dissimulações da vida em seu acontecer concreto, assumindo o Ser como velamento e desvelamento reciprocamente entranhados.

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