terça-feira, 29 de maio de 2012

O Método Socrático - PARTE I


 Em geral, o método dialógico de Sócrates é constituído por dois momentos fundamentais:
        a ironia que denuncia as verdades feitas e o falso saber daqueles que pretendiam reduzir o verdadeiro ao verosímil
        a maiêutica, técnica através da qual se consegue observar como é que uma ciência desconhecida se transforma progressivamente numa ciência conhecida. No entanto, no diálogo Protágoras, a maiêutica não aparece. Segundo Platão, Sócrates fora buscar a sua arte da maiêutica a sua mãe que era parteira. Na Grécia clássica só as mulheres que já não podem dar à luz estão autorizadas a ajudar ao parto das outras. Sócrates considerava a sua arte como a arte de parturejar; só que agora são homens que dão à luz e é do parto das suas almas que se trata.  Sócrates revelava aos outros aquilo que eles próprios sabiam sem de tal terem consciência. Ele pretendia que o seu questionamento sistemático levasse os outros a um ponto crucial de consciência crítica, procurando a verdade no seu interior, dando assim lugar ao "parto intelectual". A maiêutica é, assim, a fase positiva, construtiva, do método socrático que permite o acordo através das certezas universais obtidas pela definição após a discussão. Trata-se de um diálogo do primeiro período que se caracteriza pela ausência da teoria da reminiscência que serve de fundamento à maiêutica.
Podemos sistematizar as características principais do método de Sócrates neste diálogo tendo em conta o seu carácter dialéctico, aporético, irónico, a procura da definição e a coerência prática. Sócrates é aquele que possui a arte subtil de dialéctica que, como diz Wolff, era "um jogo de espírito e de finura  feito de fintas e de esquivas, torneio de raciocinadores armados de argumentações estratégicas e de objecções estáticas"(1985, p.33).
Através de perguntas/respostas pretendia dar e devolver argumentos entre interlocutores através de um discurso curto e preciso cujo objectivo era a procura da verdade. A este método cuja arte subtil está na capacidade de argumentar chama-se "dialéctica".
Numa primeira fase Sócrates procura de forma polémica destruir a suposta coerência do raciocínio dos seus interlocutores. Sócrates faz com que os outros falem sobre aquilo que afirmam para os obrigar a reflectir sobre aquilo que fazem. Ele opõe-se à verdade estereotipada, ao dogmatismo e pretende destruir os preconceitos irreflectidos. Quer que os seus interlocutores se consciencializem da suposta "verdade" das suas afirmações levando-os a um exame de consciência que lhes dará conta da sua ignorância. É como se os conhecimentos das pessoas fossem postos em causa através da interrogação e não de uma forma expositiva.          Assim os adversários de Sócrates são levados à dúvida relativamente aos seus próprios conhecimentos ficando embaraçados com as perguntas insidiosas e precisas, cujas respostas demonstram quão fracos são os seus argumentos e opiniões.
Mas Sócrates usava então uma das suas outras técnicas: dar a mão ao interlocutor apesar de achar que este estava vencido no argumento usado. O que Sócrates pretendia era que não houvessem vencedores nem vencidos, mas caminhar conjuntamente para estabelecer a verdade.
O carácter aporético do discurso prende-se com o facto de  Sócrates não responder  às próprias questões que lança. Não dá respostas positivas. Sócrates não pretende informar, mas formar. Aquilo que viesse do mestre em sentido único teria apenas um efeito exterior sobre a consciência do aluno; a formação só pode efectuar-se segundo o ritmo e as exigências próprias do desenvolvimento interior individual. Sócrates repete que nada sabe, nada tem para ensinar, nem ninguém a quem formar. E não tendo nada para oferecer a não ser a sua companhia basta que cada um pense por si próprio para se aperceber de que sabe mais do que ele. "Ignorância fingida, falsa modéstia, artimanha pedagógica de todo o mestre-pensador?" (Wolff, 1985, p.21). Sócrates procura na "dialéctica", arte do diálogo, muito mais do que um método de educação; vê nela um modelo da verdade, cujo princípio básico poderia ser assim enunciado: admitir apenas como verdade aquilo que o interlocutor reconheceu claramente como verdadeiro. Uma verdade possuída,  mas não partilhada com outros não seria uma verdade e permaneceria num estado de opinião ao qual se poderia chamar de estéril. Para Sócrates a educação não é uma mera transmissão de saberes,  mas sim o despertar do saber existente em cada um de nós através da auto-reflexão.
Outra das características do diálogo é a ironia zombeteira que anula o saber irreflectido dos interlocutores reduzindo a zero as suas pretensões normativas. Passa-se da certeza à dúvida e do presumível saber ao questionamento dos seus pressupostos.  Há nos diálogos de Sócrates uma curiosa revolta irónica, a Ironia Socrática, séria e trocista: O "eu não sei nada (daquilo que julgas que eu sei), mas tu sabes (aquilo que tu não sabes que sabes)" desdobra-se num "tu não sabes nada (daquilo que julgas saber), mas eu sei (aquilo de que tu nem sequer suspeitas)". É por isso que no fundo o método de Sócrates não está muito longe da nossa ironia (no sentido moderno) que, nem hipócrita nem verdadeiramente franca, diz a verdade parecendo dizer o contrário, sem nunca sabermos por onde pegar. (Wolff, 1985, p.52)

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