domingo, 20 de maio de 2012

O Ser no Mundo em Heidegger - ÚLTIMA PARTE


Significa tudo isso que a pre-sença jamais se compreende em sua abertura? De modo algum. Para Heidegger, a "compreensão" é um modo de ser-em tão originário quanto a disposição. Mas aqui não se trata da compreensão entendida como forma de conhecimento; esta última, na verdade, só é possível a partir da compreensão em sentido existencial. O ser no mundo mantém-se na familiaridade da convivência ocupacional, situado num conjunto de remissões referenciais que constituem um todo significativo. "Na familiaridade com essas remissões, a pre-sença 'significa' para si mesma, ela oferece o seu ser e seu poder-ser para uma compreensão originária, no tocante ao ser no mundo." (ibid: 132) Ao compreender o "em função de" da referência ocupacional, a pre-sença abre uma "significância" que diz respeito a todo ser no mundo e a ela própria. Além disso, a presença, por existir no modo de uma abertura, é o único ente de cujo ser faz parte o que ela ainda não é, de cujo ser atual faz parte suas possibilidades, a pre-sença sempre é o que ela pode ser. Pelo fato de "ver" possibilidades em função das quais ela é, a pre-sença se "compreende". "Compreender é o ser desse poder-ser. (....) A pre-sença é de tal maneira que ela sempre compreendeu ou não compreendeu ser dessa ou daquela maneira. Como uma tal compreensão, ela "sabe" a quantas ela mesma anda, isto é, a quantas anda o seu poder-ser." (ibid: 199-20) Não é demais enfatizarmos: esse saber "a quantas ela mesma anda" não denota um processo de consciência, pre-sença não é consciência.
Esse "saber" se presta muito bem, por exemplo, ao entendimento da situação comumente conhecida em que o indivíduo ignora conscientemente o que se passa consigo, mas o seu comportamento, visto como um todo, possui sentido, coerência e aparenta já saber desde sempre "aonde queria chegar". Com o tema da compreensão Heidegger não pretende contradizer o desconhecimento essencial da disposição. Compreensão e "saber", aqui, dizem respeito ao fato de a pre-sença constantemente se deparar com sua abertura. "E somente porque a pre-sença é na compreensão de seu pre é que ela pode-se perder e desconhecer. E na medida em que a compreensão está na disposição e, nessa condição, está lançada existencialmente, a pre-sença já sempre se perdeu e desconheceu. Em seu poder-ser, portanto, a pre-sença já se entregou à possibilidade de se reencontrar em suas possibilidades." (ibid: 200)
Desnecessário dizer que a exposição acima é limitada e seletiva. Ela não aborda, nem de longe, todos os temas, desdobramentos e insights da obra, e mesmo os temas abordados tampouco são analisados exaustivamente. Mas essa breve notícia fornece uma idéia do sentido da noção de ser no mundo na obra de Heidegger, suficiente para que se possa compreender o porquê de sua utilização na psicopatologia.

Nenhum comentário:

Postar um comentário